Desatinada de Marco Lisboa
(...)
Acordei confusa no dia seguinte, perguntando incansavelmente se alguém havia trazido algum bilhete, se algum recado havia chegado, mas a resposta foi nenhuma. E assim foi durante mais de uma semana. Eu não sabia mais que desculpa dar para não encontrar Nicolau, até que depois de três dias tentando ele parou de insistir e não foi mais. Por mais que eu devesse me aliviar com tal fato, confesso que meu ego sentiu a falta das investidas de Nicolau e esse ego ferido aumentou ainda mais a angústia e a frustração por não receber nenhuma resposta de Marco. Depois da segunda semana comecei a cogitar a possibilidade de ele não recebido minha mensagem, então mandei outra, e outra, e mais outra até não ter mais palavras para escrever. Estava tão ansiosa por tê-lo, por olhar seus olhos que se ele aparecesse naquele momento em minha frente não permitiria que emitisse um só som, pois o calaria com meus lábios com incrível rapidez.Porém, depois de três semanas sem resposta, tinha sim vontade de por meus olhos nele para cuspir em sua face.
Então na falta de Marco, recorri à única pessoa possível: Nicolau. Fui à sua casa, mas ele não se encontrava. Esperei por duas horas e ele não apareceu. Então pedi à criada que lhe dissesse que eu lá estive. Voltei para mansão e Nicolau não foi me encontrar. Nem naquela noite e nem na próxima...
– Nem um nem outro agora... – falei comigo em voz alta.
– Sua obsessão por Marco ainda te fará ficar sozinha. Nem amor, nem amigos, nem leveza. – falou Isabelita através da porta.
– Não demora e eu vou ministrar a aula. Agora por favor, me permita ficar sozinha, Isabelita. – respondi de maneira seca
Ela assentiu com a cabeça de forma frustrada e se foi, tossindo como sempre.
Na tarde seguinte, fui novamente à casa de Nicolau e a servente me disse que ele estava em um restaurante próximo com alguns sócios. Então fui a seu encontro. Ao ver-me, ele me recebeu com o mesmo sorriso amigável de sempre. Com a mesma cordialidade e afeição.
Confesso que essa atitude me confundiu deveras. Ele me chamou para sentar à mesa com eles e me apresentou como uma amiga. Quando os seus sócios se foram, ficamos lá para conversar.
– Ora! Vejo que ainda estás viva!
– Deves me odiar. – falei cabisbaixa.
– Não odeio pessoas que confirmam que eu estou certo. – olhou diretamente em meus olhos, porém ainda com muita doçura. – Então? Ele te disse que quer voltar a ser seu amante e tu estás aqui para se despedir?
– Não... estou aqui para continuar o que deixamos em suspenso. – tentei ser o mais sensual que pude.
– Veja bem, o que tu deixaste em suspenso, não eu.
– Nicolau...
– Eu não quero, Rita. Não assim. Não quero ser o entorpecente para momentos de dor.
– Não faça isso comigo, Nicolau! Preciso de você, preciso ter com quem contar...
– Não. Precisas de adorador para sustentar teu ego. És linda, inteligente e refinada. Não deverias precisar que as pessoas confirmassem isso.
– Não me deixe só nesse momento. – segurei suas mãos.
Nicolau não se abalou em nenhum instante. Continuou sorrindo com um carinho dilacerador, com admiração e amor. Beijou minhas mãos com ternura e finalmente falou:
– Da mesma forma que tu tens todos os predicados que eu enumerei, eu, de minha parte, também os tenho. Por conta disso, mereço ser algo mais do que a segunda opção de alguém. – uma lágrima escorreu por de meus olhos e ele enxugou com um beijo tão singelo quanto é possível ser. – Amo-me apesar do amor que sinto por ti. Quando estiveres pronta para realmente se entregar a mim, estarei aqui de braços abertos, esperando. Não por ser seu capacho ou seu brinquedo, mas por acreditar piamente que és a única mulher nesse mundo certa pra mim. Mas saiba que não esperarei para sempre. Sei conviver bem com amores platônicos.
Ainda tentei argumentar, mas fui calada com um olhar. Eu não poderia enganar, nem a ele, nem a mim. Marco ainda permeava todos os meus pensamentos e sensações. Então, sem dizer mais uma palavra, levantei-me e fui embora. Nicolau não tentou me impedir. Ficou apenas sentado a olhar-me ainda com um quê de admiração nos olhos.
Rita de Marco Lisboa - parte II pag. 106
*eu não sei por que, mas sempre me lembro na "Desatinada" quando escrevo alguma parte desse livro... não sei por que
Acordei confusa no dia seguinte, perguntando incansavelmente se alguém havia trazido algum bilhete, se algum recado havia chegado, mas a resposta foi nenhuma. E assim foi durante mais de uma semana. Eu não sabia mais que desculpa dar para não encontrar Nicolau, até que depois de três dias tentando ele parou de insistir e não foi mais. Por mais que eu devesse me aliviar com tal fato, confesso que meu ego sentiu a falta das investidas de Nicolau e esse ego ferido aumentou ainda mais a angústia e a frustração por não receber nenhuma resposta de Marco. Depois da segunda semana comecei a cogitar a possibilidade de ele não recebido minha mensagem, então mandei outra, e outra, e mais outra até não ter mais palavras para escrever. Estava tão ansiosa por tê-lo, por olhar seus olhos que se ele aparecesse naquele momento em minha frente não permitiria que emitisse um só som, pois o calaria com meus lábios com incrível rapidez.Porém, depois de três semanas sem resposta, tinha sim vontade de por meus olhos nele para cuspir em sua face.
Então na falta de Marco, recorri à única pessoa possível: Nicolau. Fui à sua casa, mas ele não se encontrava. Esperei por duas horas e ele não apareceu. Então pedi à criada que lhe dissesse que eu lá estive. Voltei para mansão e Nicolau não foi me encontrar. Nem naquela noite e nem na próxima...
– Nem um nem outro agora... – falei comigo em voz alta.
– Sua obsessão por Marco ainda te fará ficar sozinha. Nem amor, nem amigos, nem leveza. – falou Isabelita através da porta.
– Não demora e eu vou ministrar a aula. Agora por favor, me permita ficar sozinha, Isabelita. – respondi de maneira seca
Ela assentiu com a cabeça de forma frustrada e se foi, tossindo como sempre.
Na tarde seguinte, fui novamente à casa de Nicolau e a servente me disse que ele estava em um restaurante próximo com alguns sócios. Então fui a seu encontro. Ao ver-me, ele me recebeu com o mesmo sorriso amigável de sempre. Com a mesma cordialidade e afeição.
Confesso que essa atitude me confundiu deveras. Ele me chamou para sentar à mesa com eles e me apresentou como uma amiga. Quando os seus sócios se foram, ficamos lá para conversar.
– Ora! Vejo que ainda estás viva!
– Deves me odiar. – falei cabisbaixa.
– Não odeio pessoas que confirmam que eu estou certo. – olhou diretamente em meus olhos, porém ainda com muita doçura. – Então? Ele te disse que quer voltar a ser seu amante e tu estás aqui para se despedir?
– Não... estou aqui para continuar o que deixamos em suspenso. – tentei ser o mais sensual que pude.
– Veja bem, o que tu deixaste em suspenso, não eu.
– Nicolau...
– Eu não quero, Rita. Não assim. Não quero ser o entorpecente para momentos de dor.
– Não faça isso comigo, Nicolau! Preciso de você, preciso ter com quem contar...
– Não. Precisas de adorador para sustentar teu ego. És linda, inteligente e refinada. Não deverias precisar que as pessoas confirmassem isso.
– Não me deixe só nesse momento. – segurei suas mãos.
Nicolau não se abalou em nenhum instante. Continuou sorrindo com um carinho dilacerador, com admiração e amor. Beijou minhas mãos com ternura e finalmente falou:
– Da mesma forma que tu tens todos os predicados que eu enumerei, eu, de minha parte, também os tenho. Por conta disso, mereço ser algo mais do que a segunda opção de alguém. – uma lágrima escorreu por de meus olhos e ele enxugou com um beijo tão singelo quanto é possível ser. – Amo-me apesar do amor que sinto por ti. Quando estiveres pronta para realmente se entregar a mim, estarei aqui de braços abertos, esperando. Não por ser seu capacho ou seu brinquedo, mas por acreditar piamente que és a única mulher nesse mundo certa pra mim. Mas saiba que não esperarei para sempre. Sei conviver bem com amores platônicos.
Ainda tentei argumentar, mas fui calada com um olhar. Eu não poderia enganar, nem a ele, nem a mim. Marco ainda permeava todos os meus pensamentos e sensações. Então, sem dizer mais uma palavra, levantei-me e fui embora. Nicolau não tentou me impedir. Ficou apenas sentado a olhar-me ainda com um quê de admiração nos olhos.
Rita de Marco Lisboa - parte II pag. 106
*eu não sei por que, mas sempre me lembro na "Desatinada" quando escrevo alguma parte desse livro... não sei por que
Pois é, neh.... nada melhor do que comentar um texto meu rebatendo com outro...
Não achei mt parecido nao... masss...
xPPP
Gurias,
todos os textos estão muito bons... mas eles me lembram uma velha amiga que costumava remoer o passado e deixava de viver os momentos com a intensidade que eles exigiam. Quando não vivia no passado, se perdia na incerteza do futuro, sempre negligenciando o presente.
Assim, acabou deixando escapar alguns bons momentos.
A sensibilidade e o realismo dos textos me mostram mulheres apaixonantes, mas com uma tristesa no semblante... mergulhadas em suas próprias feridas.
Não quero tripudiar da dor de vcs, mas como alguém que sofreu demais, acho que posso dizer que as coisas boas que levamos são as lembranças dos bons momentos.
Aprendi que muitas das feridas eu abri com minhas próprias mãos. E só eu pudi fechá-las.
Feridas não têm explicação, nem culpados. Elas só sangram enquato expostas. Mas entendo que escrever pode ser uma forma de orar, de meditar e de deixar passar.
O que me faz dizer mais uma vez: gostei dos textos.
Abraços
W.